segunda-feira, 18 de maio de 2009

Como o Nordeste se viu envolvido na I Guerra

Ha cerca de 60 anos, andava eu a brincar em frente à Câmara no espaço entre a Casa da Câmara e o então Café do falecido Sr. Adelino da Fonte e, eis senão quando vi chegar dois ou três carros com Senhores vestidos de Branco, sapatos brancos e fardas semelhantes às usadas por muitas dos músicos das Filarmónicas da nossa terra. Sairam, dirigiram-se ao Café, pediram informações, julgo que petiscaram qualquer coisa e dirigiram-se para a Boca da Rua em direcção à Nazaré. Eu fiquei ali especado a pensar porque razão os ditos Senhores não traziam os Instrumentes do costume, eram poucos (uma duzia se tanto) para constituir uma banda e traziam nas mãos luvas brancas. Estes três pormenores para alem do seu ar aprumado, carros como eu nunca tinha visto e algumas continências à mistura intrigaram-me deveras. Até que me fui chegando para um grupo de pessoas que discutiam aquele assunto e tive então a certeza de que não eram músicos e que vinham ao Nordeste numa missão "Muito especial".

José Botelho de Carvalho Araújo nasceu em 18 de Maio de 1881 na freguesia de S. Nicolau, cidade do Porto, durante uma visita de seus pais a essa cidade a uns parentes seus, porquanto habitavam em Vila Real (Trás-os-Montes). José Botelho foi crescendo e aì fez a sua Instrução Primária e frequentou o Curso dos Liceus. Só mais tarde, continuou os seus estudos na cidade do Porto, na então Escola Superior Politécnica ingressando mais tarde na "Escola Naval". (é interessante que precisamente hoje seja 18 de Maio de 2009 o que significava que, se fosse vivo o José Botelho, faria hoje precisamente 128 anos).

José Botelho de Carvalho Araújo, morreu durante a 1ª Guerra Mundial no seu posto em Combate, a 14 de Outubro de 1918, na ponte do "Caça Minas" "Augusto Castilho", do qual era Comandante e tinha então o posto de 1º Tenente da Armada, passando a Capitão Tenente (a titulo póstume).

É provável que este facto seja do conhecimento de alguns, mas os pormenores do sucedido e a intervenção de alguns Nordestenses desconhecido.

Os navios que cruzavam o Atlântico Norte durante a 1ª e mesmo na 2ª Guerra Mundial, (sobretudo os Cargueiros) vinham principalmente da América do Norte, dessimulados de Cargueiros, mas muitos deles traziam "Material de Guerra", "Viveres" e "Munições" para as desgastadas tropas dos Aliados que combatiam o Kaiser 1914-18 e mais tarde Hitler 1939-45.
É tambem sabido, que mesmo os "Barcos de Passageiros", usavam por vezes os porões para o mesmo fim. Os alemães por seu lado, utilizaram sobretudo os submarinos para atacar esses barcos. Na 2ª Guerra Mundial esses submarinos eram designados como os "Tigres do mar"( estes, vagueavam pelo Atlântico e eram abastecidos mesmo no Alto Mar).

Mas vamos falar da 1º Guerra Mundial, porquanto foi nessa que Portugal se envolveu e se passou o Episódio que vos quer narrar.

A 14 de Outubro de 1918, estava a chegar de Lisboa via Funchal o "S. Miguel", navio de passageiros que então ligava Lisboa aos Açores com 206 passgeiros a bordo. O comandante deste navio em dado momento, pediu a escolta do "Caça Minas" Augusto Castilho sedeado no porto de P. Delgada.

Foi pois nesta missão, que ao largo da ilha de S. Miguel surgiu no horizonte o Submarino Alemão Tipo U-139 de 1500 toneladas dispondo de 6 tubos lança-torpedos e 2 canhões de tiro rápido de calibre 150mm. O "Caça Minas" "Augusto Castilho" dispunha apenas de artilharia de proa de pequeno calibre e colocou-se entre o S. Miguel e U-139 para proteger este, ao dirigir-se ao porto de destino P. Delgada. De imediato, o seu Comandante "Carvalho Araújo" apercebeu-se da desigualdade de potência de fogo de ambos e deu ordem de comando aos seus Homens, para se aproximarem do referido Submarino por forma a poder alcançá-lo, interpondo-se entre o S. Miguel eo referido U-139. O Submarino Alemão contráriamente afastava-se dos dois barcos, pois sabia perfeitamente que quando quizesse poderia fácilmente atingi-los sem que fosse molestado.

Passaram-se duas horas da caça do "Rato ao Gato" enquanto o S. Miguel navegava a todo o vapor para P. Delgada. Dizem os sobreviventes que esta luta durou cerca de duas horas, com fogo de parte a parte, findas as quais o U-139 atingiu ao Augusto Castilho em cheio, matando varios marinheiros da sua guarnição incluindo o seu Comandante "Carvalho Araújo"e ferindo muitos outros.
Sabem o que aconteceu depois? E se quizerem comparem com o "Terrorismo actual", (aonde não se poupam crianças e velhos, por vezes com fins pouco claros).

O comandante Alemão do U-139 rumou em direcção aos destroços da "Augusto Castilho", forneceu-lhos Àgua, Bolachas e outros Mantimentos bem como Material de Primeiros Socorros para os muitos feridos que por ali andavam. Bem como Balsas Salva -vidas para os sobreviventes. Isto que vos digo é verdade e confirmado, o que vos vou dizer agora não sei se é verdade, mas consta que o Comandante do U-139 vendo o acto heróico do nosso Comandante, mandou reunir a sua guarnição e perfilados prestaram homenagem ao Comandante morto em combate "Carvalho Araújo". Tinha este então 37 anos de Idade.

Esta Batalha naval passou-se ao largo da V. de Nordeste a 14 de Out. de 1918.

Não sei se o que vos vou dizer em seguida se teve lugar no mesmo dia, ou nos dias seguintes, mas o que sei é que depois da faina, no Miradoiro da Nazaré estava "Tio Chico Gonçalves" a olhar o mar distante para estimar pelos ventos e céus, quando poderia de novo voltar ao mar, e eis senão quando avistou as ditas Balsas Salva-vidas junto ao penedo existente mesmos em frente do referido Miradoiro e pelos seus cálculos como o mar estava movediço e soprava vento forte de Nordeste, aquela gente aflita que gesticulava e pedia Socorro iam pôr as suas vidas em perigo.

De imediato chamou meia duzia de amigos de Faina, desceram a correr ao Porto e navegaram em direcção ao penedo atrás referido. Para seu espanto e dos seus camaradas de aventuras recolheram os que podiam, atracaram as Balsas Sava-vidas aos barcos e dirigiram-se ao Porto, remando forte e compassadamente.
Este foi a primeira gesta dos bravos pescadores Nordestenses, que puseram a são e salvo no Porto, uns tantos estropiados e feridos. De seguida fizeram umas padiolas e a braços trouxeram-nos para o "Farol da ponta do Arnel".

Quem era o então Chefe de Farol? Nada mais nada menos que António Pacheco Monte, meu tio-avô por afinidade e pai de D. Maria do Carmo Pacheco Monte, casado com D. Firmina Pacheco Monte. Acontece, que estava lá o seu filho "Laurindo Pacheco Monte" Prof. primário e que na tropa tinha sido "Sargente Enfermeiro" em P. Delgada e que trabalhou e estagiou com a Drª D. Maria Joana mais tarde grande amiga de D. Maria do Carmo P. Monte. E foi ele, que com os seus conhecimentos aplicou talas aos traumatizados e curitivos primários que salvaram muitas vidas.

Pouco tempo depois Laurindo Pacheco Monte, embarcou para os Estados Unidos e não mais voltou . Eu tenho o espólio das cartas escritas por Laurindo P. Monte a sua Irmã, e será muito interessante verificar noutra situação e noutra mensagem a sua Importância em prol do Nordeste. Laurindo P. Monte, casou com uma senhora de nome Genuina La Cerda, natural do Faial e teve 2 filhos o Hernani e Maria Esbela que partiram para os Estados Unidos e só esta ultima voltou ao Nordeste já com mais de 60 anos. Laurindo P. Monte era asmático como seu pai e o médico americano que o seguia, desaconselhava-o a vir à terra Natal por ser muito Húmido.

Teve uma Ouriversaria de nome "Monte" em Fall River, e eu herdei uma Avó e um Avô. Firmina Leopoldina da Glória e António Pacheco Monte, mas esta viveu sempre na esperança de um dia rever o seu verdadeiro filho, netos e bisnetos.

Mas o que interessa extrair desta saga toda, é que foram Nordestenses letrados e iletrados, irmanados do mesmo sentido de "Servir" desinteressadamente, que fizeram História também, no desastre da "Augusto Castilho".

E quem eram os tais Senhores de Branco que eu vi chegarem ao Largo da Câmara do Nordeste?
Nem mais nem menos do que alguns Oficiais da Armada entre os quais um Contra Almirante e um Capitão de Mar e Guerra sobreviventes do "Augusto Castilho" que vinham reviver o passado e agradecer a quem os tinha Salvo. Julgo saber que ao menos estiveram com tio "Chico Gonçalves" pois o Ex-Enfermeiro Meliciano estava em Fall-River.

E para finalizar, vou dar-lhes mais um testemunho meu. Nas minhas Idas e Vindas, enquanto estudante em Lisboa utilizei o Navio "Carvalho Araújo". No Salão da 1ª Classe havia uma placa de Bronze em que o Comandante Alemão do Submarino U-139, tecia rasgados elogios ao comportamento da Guarnição do "Caça Minas" Augusto Castilho e do seu bravo Comandante "José Botelho de Carvalho Araújo"

1 comentário:

jorge araujo disse...

Dr Zulmiro segundo o Artur Arruda Franco, filho do tio Artur e da Maria Eva o penedo chama-se «Penedo do Colégio».